quinta-feira, novembro 26, 2015

APAIXONA-TE POR QUEM [NÃO] DEVES


Apaixonei-me por ele aos primeiros toques das folhas das árvores na calçada, que anunciavam a chegada do Outono. E da mesma maneira que as flores e os jardins da cidade se iam convertendo em tons alaranjados e pastéis, lentamente e sem ninguém reparar de imediato, também eu me transformei ao lado daquele homem que viria mudar a minha vida. E mais que isso: a maneira de eu a viver.

Lembro-me de estarmos a passear lado a lado, a mirar as tais folhas que cobriam os caminhos que pisávamos, e dei por mim a dar-lhe a mão. Não a medo, como sempre fizera. Mas sim com uma pura vontade de poder sentir os dedos a ocupar o espaço entre os meus. Só assim. Simplesmente assim. Ambos com sorrisos nos lábios, passeávamos por uma Lisboa acinzentada, a que demos tanta cor. Ele dizia-me que os meus olhos eram as orbes esverdeadas capazes de irromper qualquer escuridão. E eu dizia-lhe que os seus olhos cor de mar lembravam-me da minha casa, tão longe daqui.


Apaixonei-me por ele quando não devia. Apaixonei-me por alguém com um rumo já traçado, que jamais seria o mesmo que o meu. Afinal, tratava-se de um homem com passagem de ida já marcada, mas sem qualquer regresso. Um puro viajante; um aventureiro sem morada fixa e com sonhos mais longínquos do que eu alguma vez me atrevera a sonhar. Mas sabem que mais? Apaixonei-me na mesma. Mesmo sabendo que um “adeus” se anunciava, num dia já marcado no calendário, entreguei-me a ele como se nada disso me interessasse. E sabem que mais? Não me interessava. Porque, ao seu lado, eu pude viver. Eu pude ser eu mesma à flor da pele, como nunca me deixaram ser antes. E mais que isso: graças a ele, eu voltei a acreditar em tudo aquilo que há muito julgara ser impossível.

Jamais me arrependerei de ambos termos dado uma oportunidade um ao outro, por mais que os relógios todos do mundo estivessem contra nós. Houve quem me disse que me apaixonara por quem não devia. Houve quem me disse que estava apenas a desperdiçar o meu tempo. Pudessem eles saber… O quão fugazmente o meu coração batia, de cada vez que o via sentar-se ao meu lado, no tal banco de jardim. Pudessem eles saberO quão eufóricos nós éramos, a percorrer os cafés e as livrarias, tentando escapar às horas que passavam. Pudessem eles saber… O quanto vivíamos as noites como se nos durassem para sempre, por entre copos e conversas, que nem contávamos, porque as contas não nos valiam de nada. Pudessem eles saberO quanto o tempo parecia não existir de todo, quando estávamos juntos.


Ele partiu rumo ao seu destino. E eu aqui fiquei, de sorriso no rosto, ainda com o seu sabor a café a aquecer-me a boca. Ele acenou-me um “até já” antes de desaparecer por completo no horizonte. E eu enviei-lhe um beijo, apesar de saber que ele já nem conseguia ver-me. Mas sabem que mais? Eu sei que ele o sentiu.

Ora lá está: por vezes, damos por nós a apaixonarmo-nos por quem não devemos. Ou enveredamos por histórias que não fazem o mínimo dos sentidos a quem as vê de fora. Por vezes, cruzamo-nos com a pessoa mais improvável e que poderá nunca vir a ser, de todo, “aquela que vai ficar connosco para sempre”. E depois? Porque é que continuamos a dar tanta importância ao tempo que estamos com alguém, se o mais importante é o que vivemos do seu lado?


Nós fomos o mais genuínos, reais e felizes que poderíamos ser, no tempo que nos foi dado. E acredita: que nunca houve nada mais mágico do que ver as horas escapulirem por entre os nossos dedos, enquanto andávamos de mãos dadas. E que nunca lhe ressenti nem por um segundo, por ele não ter sido “o homem que ficou, apesar de tudo”, porque ele foi bem mais do que isso. Ele foi quem me mostrou que o tempo nunca é suficiente para ninguém. Mas que isso não tem nada a ver com a intensidade com que as coisas acontecem. E que “durar mais tempo”, não significa de todo ter mais valor.

Apaixonei-me por ele... Devia tê-lo feito? Podem ter a porra da certeza que sim.

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