domingo, abril 17, 2016

TU ÉS TUDO MENOS TRAPOS


Eles acham-te fraca. E quem sabe, alguns até te considerem uma anedota. “Eles”, aqueles que te levaram a perder as estribeiras; aqueles que diziam estar a jogar jogos contigo, mas estavam era a jogar contra ti. Aqueles que te enganaram; que te levaram a crer em coisas que nunca foram verdade. Ou pelo menos, que não eram totalmente verdadeiras, como eles diziam que eram. Aqueles homens que por ti passaram, uma vez ou outra, e que levaram consigo pedaços enormes de ti. Deixaram-te para aí, feita um trapo. Mas deixa-me dizer-te: tu és tudo menos trapos.

Esses homens, que por ti passaram, e que fizeram questão em fazer-te acreditar neles. Nas suas palavras sem conteúdo. Nas suas acções com menos conteúdo ainda. E nos seus devaneios do “hoje, és minha”, mas “amanhã, já não quero saber de ti”. E assim sucessivamente. Todos esses homens que te deixaram a pensar menos de ti. Que te deixaram a duvidar de ti mesma. Que te fizeram pensar: “se nenhum homem fica, talvez seja problema meu. talvez não sou mulher suficiente.” Pois, deixa-me dizer-te: nenhum deles era um homem. Não passavam de miúdos.

Tu foste sempre o melhor que conseguiste ser. Tu foste a mulher que, a medo, foi na mesma, apesar de meio mundo te ter avisado para ficares quieta. É isso que te torna tão maior que todos os outros que te fizeram sentir mais pequena. Tu nunca deixaste o medo, nem mais nada, nem mais ninguém se meter no teu caminho. Tu amaste de braços e de portas abertas. Tu foste ferida, chegaste a casa e eles haviam levado tudo consigo. E, no entanto, nem eles conseguiram fazer com que fechasses a tua casa eternamente.


E porquê? Por seres ingénua, ou parva, ou uma iludida? Não, de todo. Mas porque tu sempre fizeste por ser a grande mulher. A que perdoa, a que concede oportunidades, a que é desiludida, mas que continua a acreditar. Que continua a acreditar que os homens são todos diferentes, e que nenhuma pessoa é igual à que lhe antecede. Tu és tão forte, porque continuas a acreditar, por mais que te dêem razões para deixares de o fazer.

Mas deixa-me dizer-te uma coisa: tu não és obrigada a ser a ‘grande mulher’ todas as vezes. Tu não és obrigada a ser sempre a melhor pessoa da situação, aquela que tenta salvar todo o mundo, menos tu mesma. Aquela que coloca toda a gente à frente de si. Tu não tens de ser sempre essa mulher e, se por acaso, quiseres falhar; quiseres fugir para um clube nocturno e beber ao ponto de acabares na cama, sem sequer te lembrares de como lá chegaste, então fá-lo. Tu não tens de ser perfeita. Porque aqueles que te valem de alguma coisa, vão amar-te mesmo assim.

E se algum dia te apetecer ligar-lhe bêbeda, numa daquelas noites frias e solitárias de Inverno, que tanto te fazem doer os ossos, então liga-lhe! Liga-lhe e fala-lhe de como ele perdeu a única mulher que alguma vez foi capaz de amá-lo apesar dele destruir tudo à sua volta. Conta-lhe de como nunca desististe dele, ao passo que ele só sabia desistir cada vez mais de si próprio. E quando já tiveres a voz rouca de tanto gritar, desliga-lhe na cara e adormece a chorar a plenos pulmões.


Pois, lá está: tu não tens de ser sempre a melhor pessoa da situação, a que nunca quebra e que reage sempre à altura. Tu não tens de ser perfeita, porque o amor jamais te pediria isso. E tu bem sabes. E tu olhas para trás, para aqueles homens que tanto te prometeram o mundo, mas que nunca fizeram por ficar nele, e tu sentes-te grata. Ainda bem que nenhum deles ficou. Ainda bem que não desperdiçaste mais um segundo que fosse com nenhum dos mesmos.

E, aí, tu sorris, porque te apercebes que é isso que significa ser mulher: não ter medo de estar sozinha, por saber que não há nada pior do que a solidão na companhia de outra pessoa.

quinta-feira, abril 07, 2016

TU (NÃO) FOSTE O AMOR DA MINHA VIDA


Hoje acordei com um homem ao meu lado na cama. Fiquei a mirá-lo em silêncio enquanto este dormia de barriga para cima, por entre o emaranhado de lençóis desbotados. O seu peito erguia e baixava a cada uma das suas respirações e, por alguma razão que desconheço, dei por mim a pensar no primeiro homem que amei. Quiçá, o único - ainda hoje não tenho a certeza.

Dei por mim a pensar na pessoa que eu era, há uns anos atrás, quando o amava. Quando todo o meu peito era como o único local seguro, onde a cabeça dele repousava. Quando os meus braços e só os meus braços eram os únicos que o seguravam. Quando os beijos e só os meus beijos eram os únicos que se deleitavam na sua boca. E a única realidade que eu conhecia era aquela que vivia do seu lado. Eu amava aquele homem. Quiçá, ele amava-me também a mim - ainda hoje não tenho a certeza absoluta disso.

Vivemos aquilo a que se pode chamar um amor desenfreado, como um filme qualquer imprevisível, daqueles repletos de cenas, de pausas, de erros e de acasos que mais pareciam ser coisa do destino. Num momento, éramos capazes de estar juntos ao ponto de nem saber onde a sua alma terminava e a minha começava, por serem ambas uma só. Noutro momento, afastávamo-nos de tal maneira, durante tanto tempo, e eu chorava desalmadamente porque pensava sempre “é desta que acabou” - mas nunca era. Até, claro, à vez que foi.


Até o nosso final - adivinhado, mas não esperado - foi qualquer coisa de cinematográfico. Planeámos encontrar-nos na nossa esplanada predilecta, onde, outrora, passávamos as tardes de verão, comigo a cantar e com ele a dedilhar a sua viola. Sentámo-nos com a distância de um oceano a separar-nos e baixámos o olhar. E há pior coisa do que ter de evitar o olhar de quem se ama? Pois, lá está: já há muito que chegáramos ao ponto que até isso nos feria. Foi mesmo assim que soube que o derradeiro fim havia chegado: amá-lo arruinara-me mais que qualquer outra coisa. E há pior coisa do que sermos arruinados por quem mais amamos?

Fui ao encontro do homem que amava - quiçá, o único que amei -, com todas as verdades e mentiras a pesarem-me nos bolsos. Atirei-lhe todas as palavras, para que não me restassem (quase) nenhumas. Chorei rios e gritei tempestades. Começou a chover e a chuva confundiu-se com as minhas lágrimas, e, assim, chorei ao som dos céus que choravam comigo. E dei por mim a sorrir, porque sabia que, um dia, iria voltar a fazer sol.

Eu acreditei durante quase uma vida, que aquele homem era o amor da minha vida. a minha alma gémea. Mas ele não o foi, ele não a era. Na verdade, ele acabou por ser a minha maior lição.

Hoje acordei com um homem ao meu lado, na cama. E dei por mim a pensar no primeiro homem que amei. Quiçá, o único. Depois, acabei por pensar na pessoa que eu era quando o amava, até me ter apercebido que nada em mim, agora, se assemelha àquela rapariga de outrora. E isso é simultaneamente uma tragédia e o maior dos alívios.


Não sei de todo quando é que vou voltar a amar, nem por quem o vou fazer. Mas de uma coisa tenho a certeza: eu quero fazê-lo de outra maneira; e quero ser amada de volta como nunca antes fui. Porque lá está - aquele homem, o único que amei, nunca poderia ter sido o amor da minha vida, ou a minha alma gémea. Porque não foi ao lado dele que eu acordei, hoje de manhã. Nem será com ele que acordarei amanhã, nem depois de amanhã.

E um amor que vale a pena jamais implicaria deixar-nos a acordar sozinhos, ou ao lado de qualquer outra pessoa. E sabem uma coisa? Hoje, eu não desejei acordar ao lado daquele homem que amei. Porque a pessoa que sou hoje, ao contrário daquela que eu era, não se importa de acordar ao lado de alguém que não ama. Ele vai aparecer, qualquer dia. Mas hoje, eu não queria acordar sozinha - e tenho todo o direito em não o querer, as vezes que forem precisas.

E ninguém tem nada a ver com isso. Eu amo-me a mim e não desejo ser outra pessoa. E quem me quiser amar, que o faça desta maneira, ou então não o faça de todo.

terça-feira, abril 05, 2016

A SAGA (e os dias...) DA DEPRESSÃO


Hoje, estou num daqueles dias. Mais um daqueles dias em que a solidão levou a sua avante e enclausurou-me entre estas quatro paredes. Guardo o maço de tabaco junto à varanda, porque sei que vou fumá-lo quase de uma só vez. Trago vestida uma camisola três tamanhos acima do meu, para poder enxugar as lágrimas nas mangas que cobrem as minhas mãos. Ouço as mesmas músicas, umas a seguir às outras, mas nem lhes presto atenção. Ignoro o telemóvel e tudo o que me possa despertar para a realidade fora destas quatro paredes, porque eu, hoje, não saio daqui.

Puxo as persianas até baixo e finjo ser de noite, só para poder dormir umas cinco horas por entre a tarde. Como se o escuro do quarto fosse a desculpa perfeita para fugir da luz. Acabo a dormitar com um copo de vinho barato debaixo da cama, para não ter de o encarar enquanto me deixo levar pelo sono. Como se eu precisasse desesperadamente de uma desculpa; ou de uma ajuda para escapar… Mas escapar do quê? de quem? de mim?

E eu espero que, ao acordar sobressaltada, sem saber se é dia ou noite, tudo esteja melhor. E que eu esteja curada deste mal qualquer invisível que se alojou dentro de mim. E que toda esta batalha esteja terminada, apesar de ter sido eu quem a começou e de ser só eu quem a trava. Mas, depois, dou por mim: e estou num daqueles dias. Mais um daqueles dias em que a solidão levou a melhor de mim. Mas levou para onde, se fui eu que a deixei?


As desculpas amontoam-se na minha cama por fazer. “Desculpa, mas hoje fico em casa”, “desculpa, mas estou cansada”, “dói-me a cabeça, o corpo, desculpa…”. Peço desculpas a todo o mundo que me procura, mas nunca peço perdão a mim, que me deixei perder de mim mesma. Afinal, porque é que pedimos tantas desculpas a tanta gente, mas nunca a nós, que somos quem mais nos faz mal? Suplico perdão ao meu coração, a que já sujeitei tanta dor e mágoa, e este ri-se, porque, hoje, já nem ele acredita que algum dia as coisas serão diferentes.

E, hoje, estou em mais um daqueles dias. Mais um daqueles, que até já lhes perdi a conta. Preocupo a minha mãe, que adivinha as lágrimas que teimo em esconder por entre as mangas. Afasto quem se preocupa, por não me achar merecedora de tal, por entre desculpas que se amontoam como tralha num sótão poeirento, aonde ninguém tem coragem de espreitar. E, assim, deixo-me ficar, a afogar-me em pensamentos absurdos e inúteis, que jamais me poderiam trazer ao de cima… (e eu nem poderia estar mais para baixo…).

Não tenho coragem de encarar o espelho, a única companhia por entre as tais quatro paredes. Então, permaneço na cama a fingir que sou outra pessoa. A fingir que sou aquela que, outrora, amou; a tal que lutava com unhas e dentes por tudo o que valia a pena (e até pelo que deixava de valer!); aquela que acreditava que os dias são só nossos e que devemos viver uma vida inteira em cada um deles. Mas não. Hoje, sou só a tal que está num daqueles dias. Em que saí vencida da guerra comigo mesma.


Quiçá, amanhã seja, finalmente, outro dia. Um em que acordo e digo “chega!”, e saio à rua com uma roupa apropriada, bem arranjada e de sorriso no rosto. As mágoas, os medos e as desculpas ficam todas do lado de dentro, e eu sigo caminho, com a mala ao ombro quase vazia. E apesar de todo o vazio que se faz sentir, naquele dia, eu sinto-me de mim e sei que sou de mim e eu basto-me.

Quiçá, amanhã seja o dia. O dia em que me apercebo que sou uma pessoa forte. E que os maiores heróis são aqueles que têm de batalhar consigo mesmos, todos os dias, contra um mal qualquer invisível que eles próprios criaram nas suas cabeças. Mal, esse, que é real - e ai de quem disser que não é real. Porque só eu sei o que eu sinto, naqueles dias, em que só sinto solidão; em que só encontro razões para fugir; em que só me perco mais e mais de mim, até não me restar nada.

Enfim… Ao menos o dia já terminou. Mas eu não... Que venha mais um dia, (eu consigo).