sábado, julho 11, 2015

POR DETRÁS DAS PAREDES

Eu tenho um segredo. Quis escondê-lo de ti o máximo possível, mas tu topaste-me logo ao início. Jamais me esquecerei do primeiro dia em que me levaste a tomar café e, do nada, desvendaste-me. Simplesmente assim. Eu! Eu que sempre me revesti de máscaras e muralhas. Eu! Eu que sempre julguei ser uma perita no jogo do disfarce de indiferença.

Mas tu olhaste-me a fundo, enquanto eu tagarelava e esboçaste um meio sorriso. Mal nos conhecíamos e, no entanto, num só olhar, tu conseguiste fazê-lo: tu achaste-me. Apanhaste-me em flagrante. E tu disseste apenas: “É esse o teu mecanismo de defesa, não é verdade?”.

E era. Sempre assim o foi. Mas esse era o meu segredo, que, apesar de ser sempre descoberto, levava sempre imenso tempo. Contudo, lá estavas tu, ao meu lado, na mesa de café, a descobrires-me em cada palavra. Em cada movimento, gesto e tom de voz. Estavas a examinar-me e eu nem dei conta, de imediato. Até me teres olhado daquela maneira mais umas quantas vezes, enquanto me dizias: “É nisso que queres que acredite, não é assim?”.


Trouxeste-me ao café, mas deixaste-me num beco sem saída. E eu já só soltava risadas tontas, tão típicas de mim, quando fico sem palavras e encostada à parede. Foste-me às mangas do meu casaco e retiraste de lá todos os meus truques e manhas. E eu já só queria fugir, mas o teu sorriso dizia: “Fica. Não tenhas medo e, por uma vez, fica.”

E eu fiquei. Vacilante e cheia de complexos, mas ainda aqui estou. Assustada com tudo o que conheces de mim, e em tão pouquíssimo tempo. Amedrontada por todos aqueles momentos em que me dispo e me entrego a ti, sem nunca te conseguir esconder o que quer que seja. Como foi possível me teres apanhado tão depressa? Eu! Eu que virei um bicho manhoso - há sei lá quanto tempo -, que só sabe fisgar-se? escapar-se? Mas, contigo, não foi assim. Nem todos os segredos que já guardava há tanto cá dentro te conseguiram escapar. Como foi possível? Eu!

Eu sou uma romântica, na verdade. Acredito no amor louco e esventrado, que nos consome e toma posse de nós a cada momento que passa. Mas eu escondo isso. Eu escondo esse meu lado, porque são as pessoas frágeis que se lixam sempre. Porque são essas que passam por fracas, por chorarem em braços e em jardins públicos. Porque são essas que passam por tolas, por confessarem o quanto amam e por gritarem o quanto sofrem. Então, eu escondo todas essas facetas por detrás de uma frieza descomunal; de uma rijeza impiedosa; de uma parede de betão. 


Mas tu invadiste-me. Deitaste abaixo quaisquer barreiras que me envolviam o coração. Rebentaste com a fechadura e disseste apenas: “Solta-te. Deixa-te levar. Sente a fundo.” E eu tentei. Ainda hoje eu tento, mas assusta-me. Porque eu já há muito que só conhecia esta realidade de quem não mostra nem metade do que sente. Realidade, essa, de quem se fecha em copas, para que seja quase impossível alguém se aproximar demais e me conheça como eu sou. É estúpido, mas é uma defesa. Uma defesa de quem já se cansou de ser magoada sem qualquer dó nem piedade.

E a culpa não é tua. Mas tu sofres, que eu bem sei. Sofres com os meus afastamentos vacilantes. É a minha cobardia a tomar posse de mim e tu bem sabes. Não é justo, porque são pessoas como tu que deviam ser guardadas. E, no entanto, são pessoas como tu que eu acabo por afastar sempre.

Eu preciso de tempo para também eu me tornar capaz de me descobrir a mim mesma. Mas sinto que também preciso de ti. E o pior é saber que nunca poderei ter as duas coisas.

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