segunda-feira, outubro 03, 2016

O COMBOIO QUE PERDI...


O comboio da 1 vai cheio, mas, ao mesmo tempo, solitário como sempre. Acredito que não há solidão mais intensa do que aquela que sentimos no meio de uma multidão. E lá ia eu… e os outros… Numa viagem solitária e silenciosa, cada um rumo ao seu respectivo destino. Ah, destino. Era mesmo nele em que estava a pensar, enquanto o comboio da 1 me aproximava do mesmo.

Tu viste-me primeiro, eu vi-te logo a seguir. Os nossos olhares tropeçaram um no outro, como já fizeram tantas vezes antes. E, no entanto, podes ter a certeza que, de cada vez que tal acontece, eu recordo-me sempre da primeira vez em que olhei para ti. Assim de soslaio, como quem quer passar por discreta. Mas tu reparaste (reparas sempre naquilo que tento esconder). Tu reparaste e sorriste-me, e eu acredito que é assim que as histórias começam.

Existem pessoas que nos fazem querer parar no tempo, como se nunca nenhum fosse suficiente. E depois existes tu, que me fazes perder a noção do mesmo. Nem eu sei quantas horas passámos a percorrer a linha da costa, com o mar a vigiar-nos tranquilamente. Não olhei para o relógio uma única vez, porque quando tu estás, não quero saber de horas para nada. E como foi bom poder desfrutar do escassear das mesmas, ao teu lado. Pela primeira vez, o facto do tempo passar não me assusta, nem me magoa… Porque tu estás aqui.


Há algumas semanas atrás, alguém me perguntou como é que se sabe quando se está apaixonado. E eu sorri-lhe. Sorri-lhe e disse-lhe que, assim que aquela pessoa te aparece, tudo melhora - tanto dentro de ti, como à tua volta. Pudesses tu saber o bem que me fazes, desde que apareceste. E pela primeira vez na minha vida, consigo dizer isto em voz alta a mim mesma: eu estou apaixonada. Estou aterrorizada, mas estou na mesma. E o resto que se lixe!

Um dia, falei-te acerca de pessoas que perdemos ao longo da nossa vida. Que na altura do fim, tudo nos dói; o mundo aparenta estar a desabar e nós ficamos a sentir-nos como se não pertencêssemos a lado nenhum… Mas que, depois, passado algum tempo, somos capazes de olhar para trás e pensar: ainda bem que a perdemos. Ainda bem que não desperdiçámos nem mais um dia ali. Ainda bem que não fomos certos um para o outro. E tu concordaste e disseste que não eras pessoa de arrependimentos, e que ainda bem que perdeste quem perdeste. E eu já só conseguia pensar no quão bom foi conhecer alguém como tu.


Estávamos a caminho da despedida, após um dia que em nada se assemelhava a todos os outros. Sentámo-nos na estação, nem vimos os horários de chegada dos comboios e deixámo-nos estar. Só assim, um ao lado do outro, a desfrutar do tempo que nos restava. Sem pressas, sem lamúrias e sem dor. Só assim. O comboio parou à nossa frente, e quando fui beijar-te num ‘adeus’, este arrancou e partiu. Deixou-me ali especada, como se quisesse que eu ficasse contigo; como se até o tempo estivesse do nosso lado.

Existem coisas e pessoas que temos de derradeiramente perder. E ainda bem que assim o é. Ainda bem que perdi quem perdi. Ainda bem que perdi o tal comboio lotado e solitário. Ainda bem que te encontrei.

4 comentários:

  1. wow, tão bom. fiquei feliz de ter encontrado este texto, continua*

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    1. Fico radiante por teres encontrado e gostado. Obrigada! *

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  2. De todo.
    Ontem pela noite abri portas a um sonho louco, digno de febre. Abraçou-me com braços de sacudir, beijou-me na testa e deixou-se compenetrar do mais obscuro de mim com a certeza de uma metade da laranja para a outra. Enquanto até já a noite dormia, dançámos uma colisão atómica a uma velocidade desfocada, criámos as estrelas mais belas do céu e dos olhos, beijámos o mar inteiro e brincámos com todos os fogos. Vamos desenhando beleza em orgásmicas combinações de cores e formas do outro lado das esquinas, amamos cada vez mais almadamente cada pedra do caminho, paramos a meio da praça, ajoelhamos e choramos de alegria.

    Podia estar eufórico, mas não é de todo isso. É um sorriso de cinco em cinco minutos, um murmúrio no fundo da nuca que fala do início da felicidade, inquieto e reguila, como um bilhetinho de putos ou céu azul num inesperadamente lindo dia de novembro. É uma ansiedade e uma focagem, uma vontade imensa de acertar. É tornar a abrir portas a um sonho acordado e nem saber sequer o que se espera, guiado por um querer emancipado que corre para um portão ainda fechado, um arrepio de gelado, um dado lançado, precipitado, como eu, neste sonho quase nem sonhado.

    olá?
    não pude deixar escapar :)

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    1. Nem tenho palavras para descrever as tuas... Arrepiei-me de início ao fim. Maravilhoso, no mínimo! :) Obrigada.

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